Rio de Janeiro

ECONOMIA

Como a política de preços da Petrobras impacta na mesa do consumidor brasileiro?

Regime de Preço de Paridade Internacional (PPI) para regular o valor dos combustíveis beneficia acionistas da empresa

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
A relação é diretamente proporcional: aumentou o combustível, aumenta também o preço dos alimentos - AFP

A população brasileira tem sofrido no dia a dia a consequência da política de preços adotada pela Petrobras. As sucessivas oscilações no valor dos combustíveis impactam a inflação e chegam na mesa e no bolso do consumidor. Mas por que o preço dos combustíveis tem subido e descido com tanta frequência?

Desde outubro de 2016, ainda no governo de Michel Temer (MDB), a Petrobras passou a adotar o regime de Preço de Paridade Internacional (PPI) para regular o valor dos combustíveis. Isso significa que está embutido no valor final do combustível os custos de importação, que incluem transporte, variação do dólar e do barril de petróleo mesmo o derivado sendo produzido no Brasil. 

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De acordo com o economista Cloviomar Cararine, essa política prejudicou o mercado interno e favoreceu acionistas uma vez que a Petrobras passou a lucrar mais com a política e a repartir os dividendos com investidores.

“Essa política gera muito lucro para a Petrobras porque o custo de produção da empresa caiu muito recentemente por conta do Pré-Sal, que é muito produtivo e tem um custo baixo de produção. As refinarias também reduziram muito o custo de produção. A Petrobras está cada vez mais produzindo mais barato e vendendo cada vez mais caro. Quanto mais lucro tem, mais dividendos para os acionistas ela paga”, explica o técnico do Departamento Intersindical Estatística e Estudos Sócio Econômico (Dieese). 

A escolha pelo atual modelo já gerou, por exemplo, mesmo com as últimas reduções no valor da gasolina, uma alta acumulada até a primeira quinzena de agosto de mais de 135% no preço do combustível durante o governo Bolsonaro.

Na mesa

Contudo, o impacto maior quando se fala em combustível, é no diesel. O derivado acumula alta de 164,3% durante a atual gestão de governo. Embora não seja o único responsável pela alta no custo dos alimentos, o preço do diesel também tem efeito significativo na cadeia produtiva. 

“Como a agricultura depende dos combustíveis para funcionar, tanto o diesel,  com a utilização das máquinas e transporte dos alimentos, e a gasolina também no transporte dos alimentos, logo que aumenta o combustível, aumenta também o preço dos alimentos, é um sistema vinculado o dos combustíveis com a produção de alimentos, porque há uma dependência da agricultura”, detalha Beto Palmeira, coordenador nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). 

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Segundo Palmeira, além da atual política de preços da Petrobras que impacta o setor agrícola de pequenos e médios agricultores, os desinvestimentos em fábricas nacionais de fertilizantes e na Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que regula estoques de diversos produtos agrícolas para garantir o suprimento alimentar da população, também têm efeitos sob o preço final dos alimentos nas prateleiras dos supermercados.

“Até 2021, a agricultura dependia mais de 85% dos fertilizantes importados, então, isso também acarretou o aumento do preço de custo dos alimentos, logo isso é transferido para a prateleira e para os agricultores. Além disso, não há incentivo, política pública que incentive a produção de alimentos básicos. Um exemplo é o feijão. Desde setembro de 2016 até agora, os estoques nacionais de feijão estão zerados. Se pegamos os gráficos de feijão, há uma redução das áreas plantadas nos últimos anos e por não ter o incentivo de política para a produção de feijão, há uma migração de médios produtores para a produção de comodite”, aponta.

Solução ou problema?

Segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), considerado a prévia da inflação oficial do país, divulgado nesta terça-feira (27) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os preços dos combustíveis voltaram a ser responsáveis pela queda na inflação de 0,37% do Brasil em setembro. 

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Em junho, o governo sancionou o projeto que limita o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre itens como diesel, gasolina, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo, impedindo que os estados cobrem taxa superior à alíquota geral de ICMS, que varia de 17% a 18%, dependendo da localidade, e, desde então, os preços nos postos e gasolina têm caído.

A medida foi uma tentativa, em ano eleitoral, de conter os avanços da inflação, puxada, principalmente, pelo preço dos combustíveis. Na avaliação de Cararine, do ponto de vista estrutural do problema enfrentado pelo Brasil, a lei serviu para mascarar a instabilidade dos preços dos combustíveis. 

“Retirar o ICMS e o IPI [Imposto sobre Produtos Industrializados] têm um efeito negativo porque não garante a redução do preço, pois ele está vinculado ao preço internacional e, por outro lado, reduz a arrecadação dos estados, municípios e da própria União, mas mantém os lucros da Petrobras e o pagamento de dividendos. Quando o governo retira o imposto da gasolina ou do diesel, os mais pobres sofrem duas vezes porque ele continua pagando caro pelo produto e fica sem o dinheiro do imposto que poderia ir para a educação e saúde”, afirma o economista. 

Edição: Mariana Pitasse