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Guerra pressionará COP27: a quem caberá a defesa de nossa agenda ambiental?

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Desmatamento avança no governo Bolsonaro - Foto: Carl de Souza/AFP
É provável que a COP27 esteja longe de ser incluída na agenda dos temas prioritários do Brasil

* Por Bianca Lima, Cassia Lima, Fernando Nascimento, Sofia Spada e Diego Azzi.

À sombra da guerra na Ucrânia, a 27ª Conferência das Partes das Nações Unidas sobre a Mudança Climática ocorrerá em novembro, em Sharm El-Sheikh, no Egito, em um cenário de alta tensão. O momento é permeado por crises múltiplas e interligadas: crise energética, crise alimentar, crise ambiental, crise financeira, crise geopolítica e crise das cadeias de produção. O multilateralismo das Conferências das Partes da ONU, que já vinha pressionado pela falta de resultados efetivos desde antes da pandemia, agora enfrenta uma panorama ainda mais complexo no plano da política internacional, com o conflito predominando sobre a cooperação entre as nações. 

A expectativa corporativa para a nova edição da COP é alta, muito motivada pelo mais recente relatório do Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas (IPCC, em inglês), que se aprofunda nos atuais efeitos negativos das mudanças climáticas no planeta. Além disso, a secretária executiva da Convenção Marco do Clima da ONU (UNFCCC, em inglês), Patricia Espinosa, tem procurado reforçar a necessidade de ações efetivas para atingir a neutralidade de carbono em 2050 e manter o aquecimento global dentro da margem de 1,5 ºC.

A Conferência será realizada em clima de tensão e pressão, uma vez que durante a última reunião (COP-26, em Glasgow, Escócia) foi decidido que os países deveriam formular e implementar planos de maior ambição e intensidade para combate às mudanças climáticas. Um dos temas centrais será a necessidade de avançar nas medidas de adaptação, principalmente dos Estados em desenvolvimento e mais pobres, e as iniciativas de financiamento de projetos de adaptação climática. Isto porque são os países periféricos e mais pobres que sofrem os maiores impactos das mudanças climáticas, ao mesmo tempo que são os que menos contribuem com a emissão de gases do efeito estufa, por exemplo. Para Hamdi Sanad Loza, vice-ministro das Relações Exteriores para Assuntos Africanos do Egito, governo anfitrião da COP, a expectativa é de que os países desenvolvidos cumpram os projetos e metas de financiamento estabelecidas.

Por sua vez, o ministro de relações exteriores do Egito, Sameh Shoukry, que presidirá a Conferência, comentou que um dos focos das negociações será "como as nações em desenvolvimento podem obter financiamento para se adaptar às mudanças climáticas e financiar a transição para a energia verde". A finalidade seria, então, aumentar a ambição e garantir que os compromissos e metas firmados anteriormente não retrocedam. Aumentar a ambição passa por implementar o financiamento de projetos de energia renovável, fornecimento de água potável e alimentos saudáveis.

Outro elemento importante na COP27 é a possibilidade de que a União Europeia não consiga cumprir suas metas de redução e financiamento. Pedro Luiz Côrtes, professor da USP e membro titular do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) afirmou que a guerra na Ucrânia deve impactar a capacidade dos membros da UE de cumprirem suas metas estabelecidas na última edição. Côrtes explica que a principal preocupação é que, com os cortes no fornecimento de gás natural e outros combustíveis fósseis por conta das sanções à Rússia, países como a Alemanha reativem usinas termelétricas que utilizam combustíveis poluidores como carvão ou óleo.

O que esperar da participação do Brasil em 2022

Na COP 26 de Glasgow em 2021, o presidente Jair Bolsonaro não esteve presente, enviando como representante o Ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, como estratégia para evitar uma exposição pessoal a críticas à sua política ambiental. Na conferência que ocorre esse ano há chances de que Bolsonaro não compareça novamente, não apenas pelo seu desapreço pelos temas ambientais, mas também pelo cenário interno no país, já que a COP27 ocorre pouco tempo após o resultado das eleições presidenciais no Brasil (cujo segundo turno, caso ocorra, será no dia 30 de outubro).

Caso Bolsonaro consiga se reeleger, considerando a base do eleitorado de Bolsonaro, é difícil imaginar que, poucos dias após a vitória, o então presidente considere relevante negociar acordos climáticos - tema pouco apreciado por seu eleitorado. Se Bolsonaro for derrotado, as consequências são mais imprevisíveis, uma vez que pode relutar em admitir o resultado. Em tais circunstâncias turbulentas no plano doméstico, é mais improvável ainda que a COP27 seja tratada como uma questão relevante para ele, o que traz uma situação de imprevisibilidade e consequente fragilidade para a diplomacia ambiental brasileira.

Considerando a postura assumida por Bolsonaro ao longo dos últimos três anos e meio, é provável que a COP27 esteja longe de ser incluída na agenda dos temas prioritários do Brasil - com focos de interesse setorial em temas como mecanismos de compensação via créditos de carbono, soluções baseadas na natureza e agricultura inteligente.

A postura do governo brasileiro de evasão de suas responsabilidades ambientais e desmonte do aparato institucional de planejamento, monitoramento e fiscalização, levantará críticas por parte da sociedade civil e de outros países participantes da Conferência, já que as promessas feitas em edições anteriores, como redução do desmatamento, não apenas não foram cumpridas como novamente apresentaram uma piora nas estatísticas. Enquanto isso, no plano doméstico, a sociedade civil e o Senado discutem e avaliam quais foram os avanços que o Brasil apresentou para as metas que se comprometeu a cumprir, de modo a tentar equilibrar, ainda que minimamente, a falta de um chefe de Estado que não tenha uma postura negacionista dos problemas ambientais.

*O OPEB (Observatório de Política Externa Brasileira) é um núcleo de professores e estudantes de Relações Internacionais da UFABC que analisa de forma crítica a nova inserção internacional brasileira, a partir de 2019. Leia outras colunas.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Thales Schmidt