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O Rio de Janeiro continua armado

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A cada operação policial favela adentro, que bem pode virar uma chacina, o poder bélico é reverenciado - CARL DE SOUZA / AFP
Cláudio Castro tem prioridade clara ao garantir orçamento milionário para manter poder bélico do RJ

O governador Cláudio Castro pediu urgência à Assembleia Legislativa do Estado do Rio (Alerj), tanto negociou que conseguiu as alterações e remanejamentos de fundos de que precisava para, segundo argumentou, garantir o pagamento de salários dos seus funcionários em 2024. Parece uma manobra fácil, mas o orçamento estadual tem suas manhas. E recomendo aos cidadãos que acompanhem, pois pode vir aí um 2024 nada alvissareiro.

Pelas contas que fizemos, e não foram poucas, dinheiro bem poderia não ser exatamente um problema para o governador honrar suas contas com a população fluminense. Ainda que tenhamos conseguido uma vitória parcial preservando alguns fundos estratégicos, como o de cultura, está claro que o compromisso assumido com todos vale apenas para alguns. 

A falta de trabalho decente, segurança, saúde e educação para os milhares que comem pelas beiradas está exposta.

Mas pouco se sabe ou se comenta sobre devedores físicos que acumulam dívidas de mais de R$ 200 milhões com o estado cada um. Benevolência que não se vê no trato com o seu João, um senhor de 60 anos morador do Complexo da Maré que perdeu o emprego e hoje vende marmita de manhã para garantir a janta e anda insone com o carnê do fogão e da geladeira que comprou para dar conta dos pedidos que ele precisa que sejam muitos. Há milhares de fluminenses insones como ele. 

Enquanto isso, as secretarias de polícia contam com orçamento bilionário, o que garante armas, munições e o que há de aparato possível para matar, conforme a realidade nos mostra.

A cada operação policial favela adentro, que bem pode virar uma chacina, o poder bélico é reverenciado, e o alvo pode ser qualquer um, inclusive inocentes. Os próprios agentes podem pagar, às vezes com a vida, pela negligência e pouco uso de inteligência de quem está no comando das ações. O cenário evidencia a falta que faz uma pasta unificada para a segurança pública unificada, que tenha capacidade de executar os recursos de forma estratégica.

E seguimos sem saber sobre a política do governador para aumentar a arrecadação, recuperar ativos e, fundamentalmente, revisar isenções e cobrar de quem deve. Os principais CNPJs devedores do estado, aqueles com dívida acima de R$ 2 milhões, somam um total de R$136 bilhões. Vamos combinar que se esse valor fosse abatido do estoque da dívida pública do RJ (de aproximadamente R$185 bi), restariam apenas R$44 bilhões de dívida. E não seria necessário sequer recorrer ao regime de recuperação fiscal. Negociação de fundos, então, não estaria em pauta.

Os números acima, é importante esclarecer, correspondem ao montante bruto.  A Procuradoria Geral do Estado (PGE) argumenta que alguns valores não são recuperáveis, já que a lista inclui empresas que já declararam falência. De todo modo, o centro do debate é: por que desvirtuar o uso de fundos que viabilizam políticas sociais, e sequer acenar com a possibilidade de recuperar parte desses valores devidos.

Não esqueçamos que os juros sobre a dívida crescem de forma desproporcional ao comportamento da economia.

Enquanto o PIB cresceu 1% nos últimos dez anos, os juros da dívida são de 2,5%, ou seja, não há proporcionalidade garantida, o que cria a necessidade de gerar mais receita extraordinária. E não citei ainda as renúncias fiscais, que merecem uma revisão mais criteriosa. Sim, renovamos recentemente a redução do ICMS sobre arroz e feijão, mas há outros tantos benefícios dos setores de comércio e automotivo, por exemplo, concedidos na década de 1970, quando o estado vivia um contexto histórico e tinha estrutura produtiva diferente da atual. Os tempos são outros, as demandas também. Resumindo esse balaio em que nos meteram, estamos todos à mercê da malandragem do Executivo.

*Dani Monteiro é deputada estadual pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol) no Rio de Janeiro

**Este é um texto de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Mariana Pitasse