Rio de Janeiro

RACISMO AMBIENTAL

Artigo | As tragédias ambientais são anunciadas a todo tempo

Secretária de Meio Ambiente do Rio, Tainá de Paula comenta relação entre tragédias e desigualdade social

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Segundo Tainá, lugares atingidos são territórios que não possuem um atendimento digno às pessoas que residem lá - Silvio Avila/AFP

Há algum tempo que venho falando, denunciando o racismo ambiental que assola a vida de milhares de famílias periféricas e, na última semana, foi a vez do Rio Grande do Sul, com um saldo trágico de 48 mortes e 9 desaparecidos. Mais uma vez, são territórios que não possuem um atendimento digno às pessoas que residem lá. 

Já no final de agosto, o Morro da Formiga, na Tijuca, e da Rocinha, na Zona Sul do Rio de Janeiro, foram atingidos por chuvas torrenciais e que levaram deslizamento de terra, inundações e medo para quem mora ou frequenta esses territórios que são, frequentemente, vítimas do racismo ambiental.

Para quem não sabe, o termo racismo ambiental surgiu nos Estados Unidos, na década de 1970, quando ativistas descobriram que 75% do lixo tóxico do estado da Carolina do Norte estavam localizados em bairros com a população majoritariamente negra. No Brasil, o racismo ambiental se mostra de outras formas. Ele se apresenta, por exemplo, na falta de estrutura mínima de saneamento básico nas periferias, local de residência de maioria de pessoas negras também. 

Outro fator a se posicionar é referente às melhorias na qualidade de vida das populações. Quando se toca nesse assunto, a qualidade de vida, essas comunidades sequer são consideradas ou são tratadas como populações invisíveis. Indígenas e quilombolas são exemplos maiores desse tipo de racismo, elas são consideradas comunidades de resistência e fora dos padrões de desenvolvimento. 

Quem não se lembra das chuvas de fevereiro deste ano, em que 64 pessoas perderam a vida na cidade de São Sebastião, litoral norte do Estado de São Paulo, por falta de infraestrutura mínima para as famílias, por falta de vontade política, por racismo ambiental? São mortes que poderiam ser evitadas se o poder público tivesse tomado providências em relação à situação que a Vila Sahy vinha passando desde o ano de 2015, quando a Prefeitura de São Sebastião foi alertada das dificuldades que as famílias passavam, inclusive pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. 

Sabemos que o racismo ambiental não chega, por exemplo, na Barra da Tijuca ou em Ipanema, mas em locais com maior concentração de pessoas negras e periféricas, ele nunca deixou de existir. Rocinha e Formiga, por exemplo, são comunidades que, historicamente, sofrem nos períodos chuvosos e qual o motivo de não termos intervenções mais assertivas nessas localidades? Bem sabemos o porquê. 

Na Rocinha e na Formiga foi apenas susto, não tivemos vidas perdidas, mas no Rio Grande do Sul, a situação é alarmante e ainda pode piorar com as 9 pessoas desaparecidas. A todos nós, cabe cobrar dos poderes públicos uma melhoria no atendimento a esses territórios, levando mais dignidade e qualidade de vida às populações que moram nesses locais. Afinal, nem no Rio de Janeiro nem no Rio Grande do Sul essas tragédias são inéditas e sabemos que são anunciadas diariamente, quando da falta de políticas públicas para mitigar os riscos que essas famílias correm.

*Tainá de Paula é arquiteta, urbanista e ativista das lutas urbanas. É especialista em Patrimônio Cultural pela Fundação Oswaldo Cruz e Mestre em Urbanismo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atualmente, é vereadora licenciada e ocupa o cargo de Secretária de Meio Ambiente e Clima da Cidade do Rio de Janeiro. 

**Este é um texto de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Eduardo Miranda