Rio de Janeiro

TEATRO

Peça "Babilônia tropical - A Nostalgia do Açúcar", no CCBB-RJ, aborda contradições do projeto da modernidade nascente

Em cartaz até 1º de outubro, peça será a última encenada no espaço, antes das obras de revitalização da sala

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
teatro ccbb
"Babilônia Tropical" aborda as contradições do projeto de modernidade nascente e sua violência nos cruzamentos entre gênero, classe e raça - Brenda Paixão

Uma viagem no Recife do século XVII, na chegada dos holandeses no nordeste do Brasil, em busca das riquezas do açúcar, esse é o enredo do espetáculo “Babilônia tropical - A Nostalgia do Açúcar”, em cartaz em um dos teatros do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) Rio de Janeiro e fica em cartaz até 1º de outubro de 2023. Será a última peça encenada no espaço, antes das obras de revitalização da sala.

O espetáculo tem idealização do autor e diretor Marcos Damigo, que esteve no CCBB Rio de Janeiro no início de 2020 com "Leopoldina, Independência e Morte", espetáculo que teve grande sucesso de público e crítica.

Leia mais: Bienal do Livro: confira os destaques da programação até o dia 10 de setembro no Riocentro

Em "Babilônia Tropical", ele aborda as contradições do projeto de modernidade nascente e sua violência nos cruzamentos entre gênero, classe e raça, e as transformações que iriam ditar os rumos do mundo. Tais questões são investigadas através da história de Anna Paes, uma controversa mulher que viveu no período e escreveu um bilhete ao aristocrata neerlandês Maurício de Nassau, presenteando-o com seis caixas de açúcar quando ele chegou ao Brasil, e até hoje é guardado no Arquivo Nacional dos Países Baixos.

Segundo o diretor do espetáculo, é de suma importância trazer para o palco a história do Brasil e evocar um passado que insiste em continuar existindo.

“E tem uma potência muito grande em tornar presentes, aqui e agora, os eventos que nos constituem. O interesse do público nesse tipo de obra é uma prova disso. Ao mesmo tempo, é uma responsabilidade imensa dar vida às pessoas que vieram antes de nós, para que possamos transformar o modo como nos enxergamos e assim, quem sabe, ativar nossa sensibilidade para uma melhor compreensão de nós mesmos", explica Marcos Damigo.

Além da atriz Carol Duarte, que dá vida à personagem, o elenco também conta com Ermi Panzo, Jamile Cazumbá e Leonardo Ventura, e como músico em cena Adriano Salhab. Para Ermi Panzo, artista angolano radicado há quase dez anos no Brasil, a dramaturgia traz a ressurreição de uma personagem do século XVII e fabrica questionamentos ao revisitar fantasmas nos abrigos do escravismo e do colonialismo.

“A proposta da obra consiste na montagem de uma engrenagem que questiona a própria ideia de desenterrar essa personagem secular e é confrontada de forma paralela e/ou direta, através de subjetividades que revelam abertamente a tradução de um racismo e, obviamente, a condição de selvagem e apagamento dos indígenas. Portanto, durante a peça, segue-se nessa tentativa do aterramento dessa mulher e outras formas de reparação histórica”, aponta. 

A obra também traz a fotografia de um cenário dinâmico, que transcende o trabalho, resultando num conjunto de elementos irregulares que caracterizam a precariedade do trabalho e das condições de vida do trabalhador, atentando contra sua dignidade e à negritude majoritariamente.

A peça tem muitas camadas a serem absorvidas, conclui Leonardo Ventura, ator do espetáculo. "Enfrentamos, aqui, a questão central diante do teatro contemporâneo: a chegada de temáticas antes ocultas ou apagadas que demandam novos engendramentos, tanto de relações formais, quanto de relações profissionais e pessoais".

Edição: Eduardo Miranda