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Direito é direito | A PGR, o racismo e os esquecimentos de sempre

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Apesar de haver uma política de cotas no Ministério Público, ela é tímida e não alterou a composição da carreira nos últimos 10 anos - José Cruz/ Agência Brasil
Segundo pesquisa, 82% dos membros do Ministério Público brasileiro são brancos e 13,2% são negros

Nas últimas semanas, a imprensa tem noticiado conversas de bastidores e articulações para a definição do (a) próximo (a) Procurador(a)-Geral da República. Os repórteres de política e de justiça se juntam para dar furos e apresentar diariamente as bolsas de apostas. A cada rodada os índices e humores variam conforme a fonte.

A lista tríplice é tida como morta e apontada como a causa de todos os males causados pelo lavajatismo, caminho conveniente para reproduzir o modelo de nomeação introduzido pelo governo anterior. Enquanto a democracia brasileira se reconstrói após quatro anos de um projeto de destruição institucional, o sistema de justiça não acompanha essa transformação.

Perde-se, assim, a oportunidade de discutir a estrutura racista e desigual em que se funda o Ministério Público. No último dia 3 de julho, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) lançou, em parceria com o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), o “Perfil Étnico-racial do Ministério Público Brasileiro”.

A publicação mostra que 82% dos membros do Ministério Público brasileiro são brancos, sendo que a participação de pessoas negras corresponde a apenas 13,2% entre os que ingressaram há 20 anos e 19,6% dos que ingressaram nos últimos 5 anos. Apesar de haver uma política de cotas no Ministério Público, ela é tímida e não alterou a composição da carreira nos últimos 10 anos. O privilégio persiste e pouco foi feito.

Esse descompasso entre a composição do Ministério Público e os correspondentes índices do censo do IBGE sobre a população negra no Brasil (56,1%) inviabilizam o real compromisso do órgão com a promoção de direitos que a Constituição lhe confiou. Da violência policial aos ataques a terreiros de candomblé, do discurso de ódio à cobrança por políticas de educação antirracista, boa parte da instituição omite-se no dever de defender o projeto constitucional, seja por negar o racismo estrutural, seja por sequer notá-lo. E dessa omissão não resulta qualquer consequência. 

Os esquecimentos de sempre do Ministério Público deveriam ser um tema central na definição de seus Procuradores-Gerais.

Afinal qual agenda será adotada para fazer com que a instituição seja permeável a grupos historicamente marginalizados e subalternizados em nossa sociedade? Que tipo de medida será adotado para assegurar que a composição da instituição corresponda à diversidade da sociedade brasileira? Como vamos construir mecanismos de controle social para que a instituição não se feche em sua burocracia e implemente mecanismos efetivos de transparência e diálogo?

Como alerta Cida Bento, de nada adianta vender uma narrativa de diversidade quando a maioria do quadro de lideranças e funcionários é quase exclusivamente branca. No pacto da branquitude, baseado na autopreservação e no componente narcísico, os modelos de escolhas a portas fechadas não contribuem para a reconstrução democrática com a qual tanto sonhamos.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Mariana Pitasse