Rio Grande do Sul

VIOLÊNCIA

Juíza defere pedido da Defensoria e afasta servidores da FASE suspeitos de crime de tortura

Ação coletiva da Defensoria Pública traz relatos de agressões físicas e psicológicas contra adolescentes

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Os casos, de acordo com as denúncias, teriam acontecido no setor de atendimento especial da Comunidade Sócio-Educativa (CSE), no complexo da Vila Cruzeiro, em Porto Alegre - Foto: Reprodução

A juíza da 3ª Vara do Juizado da Infância e Juventude do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, Karla Aveline de Oliveira, decidiu, nesta sexta-feira (16), afastar os servidores da Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do Rio Grande do Sul (FASE) suspeitos de agressão a socioeducandos na instituição. A ação foi ajuizada pela Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (DPE/RS), nesta terça-feira (13). 

A ação coletiva da DPE/RS traz relatos de agressões físicas e psicológicas contra adolescentes. Os casos, de acordo com as denúncias, teriam acontecido no setor de atendimento especial da Comunidade Sócio-Educativa (CSE), no complexo da Vila Cruzeiro, em Porto Alegre. 

Dos 24 adolescentes na instituição, foram coletados mais de 20 depoimentos. O Brasil de Fato RS teve acesso a ação coletiva onde constam os relatos das agressões físicas e ameaças. 

Sobre a decisão 

“Normalizar”, “domesticar”, “civilizar” sempre foi a regra de ouro das instituições! Veja-se a naturalidade com que servidores públicos subjugam, agridem e humilham um adolescente, sob as câmeras de vigilância, nas dependências de uma unidade da FASE, no ano de 2022”, destaca a juíza.

Conforme expõe a magistrada, atualmente a unidade CSE, que possui capacidade total para 103 internos, encontra-se com apenas 24 jovens internados, ou seja, sua ocupação atual não corresponde nem mesmo a 25% da capacidade máxima. “A baixa ocupação populacional corresponde justamente à condição mais favorável para prestação de um atendimento qualificado pela FASE, o que, na prática, parece não se concretizar”, aponta. 

Karla aponta que desde o primeiro dia que começou no Juizado da Infância e da Juventude observou que os atendimentos especiais (local de isolamento da CSE) não obedeciam todo regramento que deve ser feito. “Seja em total desatenção quanto às formalidades em torno das CADs (Comissão de Avaliação Disciplinar) que redundavam/redundam, de imediato, em isolamento do convívio de imediato,além da falta de cumprimento do prazo legalmente previsto para comunicação em juízo a respeito do encaminhamento dos jovens ao setor de Atendimento Especial (24h).”

Segundo expõe o documento, o relato constante na ação coletiva da Defensoria, sobre os episódios de violências, ocorridos em dias diversos com diferentes jovens, revelam a reiterada prática abusiva, violenta e desumana na condução do trabalho socioeducativo no interior da unidade CSE em relação aos jovens em cumprimento de medida socioeducativa de internação. 

"O relato descreve crimes de tortura. E foi o que falei na minha decisão porque isso é crime de tortura, está tudo esclarecido ali. Por isso eu faço referência ao manual do tratamento dos crimes de tortura, todo mundo tem que fazer formação sobre isso. Quando escuto essas violências nas audiências de custódia vou começar a chamar de crimes de tortura, porque depois não investigam como crime de tortura. Fica como se fosse uma agressão, uma agressão psicológica. Não, isso tudo é crime de tortura", afirma a juíza. 

Na decisão, Karla ressalta ser necessário que os servidores públicos lotados nas unidades de internação (os quais exercem suas atividades laborais em frequente contato com os jovens privados de liberdade) sejam instados/direcionados, por seus gestores, ao desempenho de suas obrigações legais de forma respeitosa e digna.

“Os fatos narrados pela Defensoria Pública na petição inicial, se comprovados no curso do processo, mas cujos indícios são mais do que suficientes para a concessão do pedido liminar de afastamento dos servidores, representam evidente constrangimento, humilhação e sofrimento psicológico aos adolescentes que se encontram sob a custódia do Estado”, afirma. 

A juíza indeferiu os pedidos de interdição da unidade e de vedação da utilização do setor de atendimento especial. Sobre o pedido de indenização coletiva, a Defensoria apresentou desistência, que foi acolhida pela magistrada. 

Por ser classificado como crime de tortura, a magistrada encaminhará para a Promotoria de Direitos Humanos, do Ministério Público, para que o órgão possa oferecer a denúncia.

Veja aqui a decisão completa. 


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Edição: Katia Marko