Rio de Janeiro

DISCRIMINAÇÃO

Jornalista denuncia por racismo funcionária de joalheria do Norte Shopping (RJ)

Nilza Valéria Zacarias conta que foi chamada de "favelada" e "pobre" durante discussão com a subgerente da unidade

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Nilza Valéria é jornalista, tem 50 anos e é da coordenação nacional da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito - Foto: Arquivo Pessoal

Na noite do último sábado (15), a jornalista Nilza Valéria Zacarias, da coordenação nacional da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, denunciou em suas redes sociais ter sido vítima de racismo na joalheria Olimpia Store, localizada no Norte Shopping, no bairro do Cachambi, no Rio de Janeiro. Na postagem, Zacarias detalha que a funcionária da loja a chamou de “favelada” e “pobre” após uma discussão relacionada ao horário de funcionamento da joalheria.

Ao Brasil de Fato, a jornalista contou que foi ao shopping para um reparo na pulseira do seu relógio. Segundo ela, ao chegar ao estabelecimento, por volta das 21h40, perguntou ao segurança onde ficavam as joalherias. Recebendo a orientação do funcionário, a jornalista foi até o local indicado e viu que na Olimpia a porta encontrava-se fechada, mas a luz no interior da loja estava acesa e uma funcionária estava no local. Ela, então, tentou abrir a porta mais de uma vez, sem entender que o expediente já havia terminado.

“Eu não tinha a informação ainda de que as joalheiras fechavam 21h30. Eu olho pro relógio, são 21h40. Vou na direção do meu marido para procurar outra joalheria. Nisso, eu estou me afastando da loja, ela [funcionária] fala, grita : 'favelada’. Ai eu voltei para perto da loja e meu sangue subiu. Eu falei: ‘repete, o que você está falando?’  Então, ela começa a falar: ‘você é grosseira, queria destruir a minha porta’. Eu falei: ‘eu quero que você repita porque vou chamar a polícia’. Ai ela falou: ‘chama a polícia que eu vou chamar os seguranças’”, contou Zacarias.

“Eu estava discando 190 porque tive a compreensão de que ‘favelado’ carregava uma conotação racista. Até porque a pessoa ser chamada de favelada não é demérito. Não há problema, mas ficou evidente, pois é muito explícito me chamar de macaca ou qualquer coisa do gênero. Acho que o ‘favelada’ vem pra me ofender e atingir”, conclui.

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Segundo Zacarias, momentos depois, dois seguranças apareceram na porta da Olimpia e perguntaram o que estava acontecendo. A jornalista explicou que tentou entrar na loja, pois não sabia que já estava fechada e a funcionária a agrediu verbalmente. Por sua vez, o segurança falou que o horário de funcionamento das joalherias é facultativo, informação, que de acordo com a jornalista, não foi dada pelo primeiro segurança anteriormente.

À reportagem, a integrante da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito contou que a segunda agressão ocorreu após a funcionária sair escoltada da loja.

“Ela [funcionária] queria ir embora, precisava apagar a luz e fechar a porta. O segurança fica com ela pra fazer isso. E o outro segurança falou comigo para irmos ao serviço de atendimento ao cliente para registrar a ocorrência. Eu falei: ‘vocês vão escoltá-la, como se eu fosse um animal feroz?’ Nesse momento, ela [funcionária] mete a segunda: ‘pobres são assim’, quando ela fala isso, eu vou atrás e falo: ‘você é racista, tudo isso que você está falando é porque você é racista’. E ela diz: ‘impossível ser racista porque eu sou casada com um negro e tenho uma filha escura’. Ai eu desisto. Subo a escada com o segurança que está ao meu lado e vou ao serviço de atendimento ao cliente”, detalha a jornalista.

Zacarias informou que registrou a ocorrência no shopping e que nesta terça -feira (18) irá à Delegacia de Crimes Raciais, no bairro da Lapa, para também registrar a ocorrência. 

Repercussão

A Frente de Evangélicos Pelo Estado de Direito escreveu uma carta de repúdio que será entregue hoje à direção do Norte Shopping. No documento, o movimento cobra respostas do estabelecimento.

“Nós, da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito - um movimento de defesa da democracia e dos direitos humanos, queremos saber quais providências serão tomadas diante do fato ocorrido com a jornalista, mulher negra, Nilza Valéria Zacarias - que compõe a coordenação nacional da Frente e é uma ativista reconhecida por seu trabalho de articulação no combate à pobreza, à desigualdade e às iniquidades que imperam no Brasil, como o racismo e a misoginia.”, diz um trecho da carta.

Outro lado

O Brasil de Fato procurou o Norte Shopping e a Olimpia Store para um posicionamento a respeito do caso. A advogada da Olimpia, Luciana Leal de Oliveira, informou à reportagem que “a cliente começou a ofender a funcionária Roberta, que é subgerente da loja, dizendo que tinha a obrigação de ter algum aviso no shopping sobre a mudança de horário e que ela continuou a forçar a porta”. Segundo a representante legal da empresa, houve uma discussão entre ambas a respeito da regra.

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“Foi dando a hora da funcionária sair e a discussão continuou, mesmo com a chegado do segurança. A cliente disse que isso só ocorreu porque ela era negra, fato totalmente descabido, isso ocorreu porque a loja estava fechada”, disse a advogada. 

Segundo Oliveira, a primeira atitude da empresa após o ocorrido foi a de ouvir sua funcionária e o segurança do shopping. 

“A posição da empresa é e sempre será o tratamento de seus clientes com respeito, as proprietárias da empresa não compactuam com nenhum tipo de tratamento desigual para seus clientes, seja por raça, cor, religião ou nível social. O público alvo da empresa são pessoas de classe C e D. A empresa apurou os fatos e não constatou dentro da apuração que fez nenhuma atitude de racismo ou religião, apenas uma questão administrativa a loja estava fechada e não poderia atender nenhum tipo de pessoa”, disse Oliveira ao Brasil de Fato.

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Já o Norte Shopping, por meio de nota, disse que “preza por proporcionar um ambiente saudável e de respeito para todos os clientes e não compactua com qualquer ato em desacordo com seus valores. Seguimos em contato com a loja para que situações como essa não aconteçam e reforçar as boas práticas de atendimento ao cliente”.

Edição: Mariana Pitasse