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Opinião | "Quem tem fome tem pressa": aumento da pobreza e a volta da fome ao Brasil

Ação solidária da Cáritas distribui cestas básicas a mais de 3.500 famílias no Maranhão e Piauí

Brasil de Fato | Imperatriz (MA) |
Projeto prioriza famílias chefiadas por mulheres impactadas pela insegurança alimentar - Elinalva Ribeiro

“Durante o trabalho vimos que realidade de muitas famílias. É bem triste frente à retirada de direitos, insegurança alimentar, desemprego e todo desmonte das políticas sociais. Foi uma caminhada muito desafiadora e gratificante desde as primeiras reuniões, encontros com as famílias e lideranças das comunidades, até a distribuição dos alimentos. Sentimos que foi e está sendo um belo trabalho coletivo, solidário e de voluntariado realizado por muitas mãos no Maranhão e Piauí.”

O depoimento é do agrônomo Ivo Rodrigues de Oliveira Neto, 27 anos, um dos agentes que ajudou a, para além de alimentos, auxiliar mais de 3.500 famílias em situação de vulnerabilidade social, atendidas em 18 municípios do Maranhão e três do Piauí, através do projeto “BRA 622 – Alimentação emergencial no combate aos efeitos da pandemia da covid-19”, desenvolvido pela Cáritas Brasileira em parceria com a Cafod, organização inglesa de cooperação internacional.

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O projeto prioriza famílias chefiadas por mulheres e com crianças em idade escolar, afastadas do ambiente educacional em razão da crise sanitária global, a partir de um diálogo do Setor de Emergência da Cáritas Brasileira sobre a situação do aumento da pobreza e a volta da fome ao Brasil como uma questão urgente que necessitava de uma ação solidária.

Para a Cáritas, essa é uma ação emergencial que tem a perspectiva de ajuda humanitária, com a consciência de que uma cesta básica não resolve o problema da fome, mas ameniza por algum tempo essa situação. É também um gesto que busca fortalecer a solidariedade, a partilha, o cuidado com as pessoas, como contraponto ao descaso e a disseminação do ódio e da violência que tem prevalecido no país.


No Brasil, mais de 84 milhões de pessoas estão com fome ou em insegurança alimentar / Cáritas

A manchete de que o Brasil voltou ao mapa da mapa, com suas variações aqui e acolá, é triste e vergonhosa, porém real, e mostra somente a ponta do iceberg. Atualmente, no país governado pelo presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro, terreno fértil para a escalada neofascista em curso no mundo, mais de 19 milhões de pessoas passam fome e mais de 116 milhões sofrem algum tipo de insegurança alimentar, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e estudos da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Pessan).

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Uma inequação ajuda a entender o problema: Bolsonaro foi alçado ao cargo máximo da república sem projeto ou plano de governo, ancorado em discursos de ódio, uma rede sórdida de distribuição de mentiras – ou o eufemismo fake news, a que acabamos por nos acostumar – e com gestos e atitudes ao arrepio da lei, como fazer apologia à tortura e a notórios torturadores; com pouco mais de um ano de governo, a pandemia do novo coronavírus alastrou-se no Brasil, encontrando no mandatário um aliado, que sempre desdenhou de quaisquer normas de segurança sanitária e da vacinação, optando por estimular o uso de remédios ineficazes contra a covid-19.

Não à toa o país ultrapassou 600 mil mortes pela doença em outubro de 2021, pouco mais de ano e meio após a identificação dos primeiros casos no país, e mantendo ainda uma média de 500 óbitos diários – estudos comprovam que cerca de 480 mil vidas poderiam ter sido poupadas, caso as tratativas para aquisição de vacinas tivessem demorado menos.


Organizações sociais de todo o país se mobilizam na tentativa de reduzir os níveis de insegurança alimentar / Cáritas

“Uma cesta dessa melhora muito o nosso dia a dia. A gente poupa o dinheiro. O dinheiro que é de comprar uma merenda de manhã, eu já compro um remédio, ou compro um material higiênico, tipo um sabão, um produto de limpeza. Isso é muito bom, quando vem uma cesta dessa é uma grande ajuda pra gente”, comenta Maria Francisca Nascimento Araújo, moradora do bairro Bacuri, em Imperatriz, catadora de materiais recicláveis, chefe de família e mãe de três filhos, de 18, nove e seis anos, respectivamente.

Da ida a campo, com a seleção e cadastro das famílias, até a distribuição das cestas, foram cerca de três meses de trabalho, entre agosto e outubro. Foram beneficiadas famílias dos municípios de Bacabal, Balsas, Benedito Leite, Cantanhede, Caxias, Chapadinha, Codó, Conceição do Lago Açu, Imperatriz, Itapecuru-Mirim, Loreto, São Benedito do Rio Preto, São Raimundo das Mangabeiras, São Luís e Vargem Grande, no Maranhão, e Oeiras, Simplício Mendes e São Francisco, no Piauí.

 “A gente vive em dificuldade. O tempo está difícil para nós. Tem dia que a gente cozinha, tem dia que a gente não cozinha, é assim. A cesta que a gente ganhou ajudou bastante”, relata Maria Carmelita Sousa dos Santos, mãe de quatro filhos, moradora da Vila Peru, em Conceição do Lago Açu, beneficiária do Bolsa Família., que tem como fonte de renda familiar o trabalho do marido, pescador.

A ação foi construída em conjunto com os dois estados, em parceria com a Cáritas Nacional e em diálogo direto com a Cafod. Lá nos municípios o desafio foi cadastrar na plataforma Kobo todas as famílias beneficiárias, levando em conta os critérios do projeto para definição do público prioritário: famílias em situação de extrema vulnerabilidade, com crianças e adolescentes em idade escolar fora da escola em função da pandemia, e por isso sem acesso à alimentação escolar, e preferencialmente chefiadas por mulheres. Nossas equipes nos municípios foram a campo, de domicílio em domicílio, identificando essas situações.

"A sociedade brasileira amarga um momento dramático de uma história política e econômica com esse desgoverno federal autoritário, antidemocrático, homofóbico, machista, racista, e quem tem pago o preço mais alto, inclusive com a própria vida, são as minorias e os mais pobres”, afirma Lucineth Cordeiro, secretária executiva da Cáritas Brasileira Regional Maranhão.

Edição: Vivian Virissimo