Após 10 meses de tramitação, nesta sexta-feira (30), se confirmou o impeachment do ex-governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC). Seu mandato foi um dos mais rápido da história do estado com duração de apenas um ano e sete meses - ficando atrás apenas de Francisco Dornelles (Progressistas) que substituiu Luiz Fernando Pezão (MDB) em duas ocasiões do mandato, somando cerca de nove meses de governo.
Da mesma forma em que foi meteórica sua carreira política: desconhecido de grande parte da população, o ex-juiz federal surpreendeu na eleição para governador de 2018 - ao sair na frente no primeiro turno e depois derrotar o favorito Eduardo Paes (Democratas), atual prefeito da capital.
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O afastamento definitivo de Witzel foi aprovado antes mesmo de encerrar a votação do Tribunal Especial Misto, por maioria absoluta. Witzel é o primeiro governador do Rio a sofrer impeachment.
O resultado desta sexta (30) acompanhou outro inusitado número batido pelo ex-governador do Rio ao não conseguir nenhum voto contrário à abertura de seu processo de impeachment, instaurado em junho de 2020. Foram 69 votos a 0, ou seja, uma decisão unânime entre os deputados estaduais da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Isso nunca havia acontecido na história brasileira.
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Antes mesmo de iniciar o processo de impeachment, Witzel foi afastado do cargo no dia 28 de agosto pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) por suspeitas de integrar uma organização criminosa que desviou na Secretaria Estadual de Saúde recursos que seriam destinados para a compra de respiradores no combate à pandemia da covid-19. Meses antes a Alerj havia autorizado a abertura de processo de impeachment contra o governador.
Desde então, as datas para o rito final foram sendo sucessivamente alteradas, por conta de uma série de recursos da defesa do ex-governador que atrasaram o andamento do processo, até que a votação foi agendada para esta sexta (30).
Não bastasse essas informações particulares sobre o impeachment, na rápida carreira política de Witzel, durante a campanha e como governador, polêmicas, posicionamentos violentos e declarações descabidas não faltaram.
Relembre abaixo algumas delas:
Quebra da placa Marielle
Uma placa de rua feita em homenagem à vereadora Marielle Franco, assassinada em março de 2018 junto com o motorista Anderson Gomes, foi quebrada durante um ato de campanha de Witzel, ainda candidato ao governo do Rio.
O ato aconteceu no domingo anterior à eleição de 2018. Na ocasião, Witzel estava ao lado de Daniel Silveira (PSL), eleito deputado federal, e Rodrigo Amorim (PSL), deputado estadual mais votado naquele ano, em Petrópolis, na Região Serrana.
Após forte repercussão negativa e diversas manifestações contrárias ao ato, já como governador, Witzel se reuniu com os pais da vereadora e pediu desculpas.
“Mirar na cabecinha”
O governo de Witzel foi marcado por forte política de intervenções militarizadas em favelas e periferias do estado, resultando em altos índices de violência, criminalidade e mortes. Ao longo de seu mandato, o ex-governador fez diversas declarações contra a política de direitos humanos e em estímulo à violência.
Uma delas foi feita dois meses antes de tomar posse, quando Witzel afirmou que “policiais que matassem bandidos portando fuzis não deveriam ser responsabilizados pela morte em hipótese alguma”.
Disse ainda que a autorização para “abate” seria oficializada, sem que isso aumentasse a letalidade no estado. “O correto é matar o bandido que está de fuzil. A polícia vai fazer o correto: vai mirar na cabecinha e… fogo!”.
Irmão preso por relação com PCC
Na última quinta-feira (22), o sargento da Polícia Militar de São Paulo, Douglas Renê Witzel, irmão de Witzel, foi preso em operação do Ministério Público, que investiga a ligação de pessoas com o Primeiro Comando da Capital (PCC).
Douglas trabalhava como agente de segurança de escolta na Assessoria Policial Militar do Gabinete do Prefeito Bruno Covas (PSDB) e foi exonerado do cargo no dia 7 de julho de 2020. O Ministério Público acredita que Douglas informava o PCC sobre as operações policiais que ocorreriam em suas áreas.
O policial militar está preso no presídio militar Romão Gomes.
Uma faixa para ele mesmo
Witzel chamou atenção também por inaugurar uma indumentária após tomar posse como governador: uma faixa transversal com as cores da bandeira do estado - inspirada no modelo presidencial. O curioso é que o adereço nunca foi algo de praxe no Rio de Janeiro, muito menos se tratou de um objeto oficial.
De acordo com a assessoria do governo, o próprio Witzel mandou confeccionar o material para ser entregue pelo governador que o antecedeu, Francisco Dornelles. Durante a cerimônia de posse, ele não retirou a faixa nem para realizar uma reunião com o secretariado. Também fez questão de vestir em cerimônias de posse e de inauguração durante seu mandato.
Comemoração da morte em rede nacional
Em agosto de 2019, um homem sequestrou um ônibus e estava prestes a se entregar, quando foi morto por atiradores da Polícia Militar. Logo em seguida, o então governador protagonizou uma das cenas mais escandalosas de seu mandato.
Witzel chegou de helicóptero à Ponte Rio-Niterói, local do crime, festejou com socos no ar e o punho cerrado a execução do sequestrador, que agiu sozinho e portava uma arma de brinquedo. Os 37 reféns foram libertados sem ferimentos.
"Guantánamo carioca" e navios presídios
Na cerimônia de posse do secretário de Polícia Civil, Marcus Vinicius Braga, em 2019, o governador falou sobre o crime organizado no Rio e citou a prisão militar dos Estados Unidos na ilha de Guantánamo em Cuba – um lugar com longo histórico de tortura aos presos.
“Os que estão de fuzil na mão nas comunidades são terroristas, e devem ser tratados como tal. A lei antiterrorismo pode dar penas de 50 anos em estabelecimentos prisionais destacados, longe da civilização. Precisamos ter a nossa Guantánamo”, disse.
Pouco antes do segundo turno das eleições, Witzel também declarou que um de seus planos para área da segurança pública no estado seria fazer “navios presídios” em alto-mar para abrigar o contingente de presos que não cabem em terra. Também disse que, se necessário, “cavaria mais covas para enterrar criminosos”.
Sem dinheiro para advogados
No dia marcado para prestar seu depoimento para o Tribunal Especial Misto durante o processo de impeachment, Witzel pediu mais 20 dias, alegando que estava trocando seus advogados em razão dos custos financeiros.
Os membros do Tribunal, contudo, entenderam que o governador afastado tentou criar uma manobra para atrasar o andamento do processo e manteve o depoimento para o mesmo dia.
Edição: Jaqueline Deister