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Economia, política e injustiça social

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Durante muito tempo, a elite do poder criou a ideologia de que o bolo precisava, primeiro, crescer para depois ser repartido - Créditos da foto: Reprodução/Internet
400 anos de regime de escravidão resultou na aceitação da violência de exploração de trabalhadores

O neoliberalismo operou a separação entre a economia e a política, de modo a proteger os operadores econômicos de qualquer controle. Se a política for definida como defesa do interesse comum, o interesse econômico passa por cima.

Na teoria, a predominância do interesse de lucro sobre o de bem-estar social já vigora há muito tempo. Hayek recusa o conceito de “justiça social” o qual considera absurdo, já que este julga o que não pode ser julgado. Ele parte da premissa de que não existe critério algum por meio do qual poderíamos descobrir o que é socialmente justo, porque não existe um sujeito por quem essa injustiça poderia ser cometida. A primeira premissa de Hayek é falsa, logo sua conclusão também o será. Não é possível julgar os fatos econômicos como fatos jurídicos.

O neoliberalismo é um fenômeno político-econômico universal, regido por ideologias vigentes. O julgamento que se faz dele é um processo de juízo também universal, ao invés de direito positivo. O conceito de justiça social não pertence ao direito, mas à história.

Colocamos em evidência o fato de nos EUA, 58% de todo crescimento real de renda gerada entre 1976 a 2007 foi embolsado por apenas 1% de famílias mais ricas. Na base da pirâmide, isto é, entre as classes operárias e trabalhadores autônomos, houve estagnação e queda de salários reais, agravada pelo desemprego. Na Europa, também, o aumento da desigualdade nos últimos anos foi marcante, porque os 20% mais ricos ganharam quase cinco vezes mais que os 20% mais pobres. A única coisa que se pode manifestar diante dessa situação, de imediato, é indignação, repulsa e protesto.

Nos EUA, 58% de todo crescimento entre 1976 e 2007 foi embolsado por apenas 1% mais ricos

Não existe um fórum que possa sentenciar o fim dessa humilhação universal. Existem, sim, fóruns universais que podem debater os problemas e buscar, a longo prazo, as soluções históricas cabíveis. É oportuno lembrar que o Fórum Social Mundial (FSM), que há vinte e quatro anos vinha se reunindo em diversos continentes era um desses instrumentos. Em 2010 o geógrafo britânico David Harvey chamou a atenção para o fato de que o crescimento econômico sem interrupção é impossível e o capitalismo não sobrevive sem ele. Logo, o capitalismo deve ser substituído porque a natureza e a sociedade não aguentam mais tanta exploração.

No Brasil, as causas das injustiças sociais na atualidade são remotas e marcantes. Depois de quase 400 anos de regime de escravidão resultou na aceitação da violência de exploração de trabalhadores, herdando dai os preconceitos de classe e de cor. A educação, a cultura, a ideologia das elites no poder, contribuem para uma aceitação com naturalidade, os privilégios de poucos e a supressão dos direitos de muitos.

Mulheres recebem salários menores que os homens; a renda dos negros é menor que dos brancos; as penalidades por crimes idênticos são mais severas aos negros e aos brancos pobres que aos ricos. Em 2004, quatro fiscais do Ministério do Trabalho, em operação de combate ao trabalho escravo, na agricultura, em Unaí MG, foram assassinados. O mandante e os executores da chacina foram condenados, mas privilegiadamente, não cumpriram as penas a eles sentenciadas.

Durante muito tempo, a elite do poder criou a ideologia de que o bolo precisava, primeiro, crescer para depois ser repartido. Com isso, justificava o fato de reduzir as vantagens e diretos dos trabalhadores. Ao invés de recompensas, com a lucratividade, os empresários adquiriram máquinas e robôs e dispensaram os trabalhadores. Consequência: concentração de rendas e aumento da pobreza. Então, Senhor Hayek, isso não é injusto?

Antônio de Paiva Moura é docente aposentado do curso de bacharelado em História do Centro Universitário de Belo Horizonte (Unibh) e mestre em história pela PUC-RS.

Edição: Elis Almeida