Rio de Janeiro

RACHADINHA

MP-RJ vai ao Supremo para que investigação de Flávio Bolsonaro retorne à 1ª instância

Advogados de senador insistem em foro privilegiado; ministro Marco Aurélio já estipulou que Flavio não possui benefício

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Decisão ocorreu na semana seguinte à prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor e amigo da família Bolsonaro - Reprodução

O Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) informou nesta segunda-feira (29) que vai contestar no Supremo Tribunal Federal (STF) a medida que tirou da primeira instância a investigação das "rachadinhas" envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) na época em que ele era deputado estadual. 

Na última quinta-feira (25), desembargadores do Tribunal de Justiça atenderam a um pedido da defesa de Flávio Bolsonaro e decidiram que a investigação se dará na segunda instância, pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado, composto por desembargadores. Mas o MP-RJ argumenta que a mudança fere decisão tomada anteriormente pelo ministro do STF Marco Aurélio Mello, que havia estipulado que o senador não possui foro privilegiado em fatos investigados no estado. 

"O MP-RJ requer a autorização para a continuidade das investigações contra Flávio Bolsonaro pelos fatos ocorridos enquanto deputado estadual, em primeiro grau, com a atribuição do Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (GAECC/MPRJ) e sob a supervisão das medidas do Juízo da 27ª Vara Criminal da Capital (TJRJ)", afirma trecho do documento assinado pelo MP.

Investigação

No último 18, o juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal, determinou a prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio e amigo de longa data da família Bolsonaro e a quebra do sigilo fiscal e bancário do filho do presidente da República, Jair Bolsonaro. Se o STF não atender ao pedido do MP, o caso sai das mãos de Itabaiana.

Apesar da mudança de foro, os desembargadores decidiram na semana passada pela validade das decisões do juiz no processo até o momento, que incluem a prisão de Queiroz e o mandado de prisão contra sua esposa, Márcia, que permanece foragida.

A decisão de Itabaiana, no último dia 18, se baseou em investigação do MP-RJ que aponta o senador Flávio Bolsonaro como líder da organização criminosa da qual Fabrício Queiroz, atuava como operador financeiro.

::Entenda o caso Queiroz e as denúncias dos crimes que envolvem a família Bolsonaro::

“As movimentações bancárias atípicas e o contexto temporal nas quais foram realizadas resultam em evidências contundentes da função exercida por Fabrício Queiroz como operador financeiro na arrecadação dos valores desviados da Alerj [Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro] quanto na transferência de parte do produto dos crimes de peculato ao patrimônio familiar do líder do grupo, o então deputado estadual Flávio Bolsonaro", afirma trecho do pedido de Itabaiana.

Segundo o MP-RJ, a atuação de Queiroz não se limitava à arrecadação dos valores junto aos demais assessores, já que ele também transferia parte dos recursos para o patrimônio familiar do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, “mediante depósitos bancários que ocorriam de forma fracionada em valores menores de despesas pessoais do aludido ex-deputado estadual e de sua família, em período coincidente com o afastamento do sigilo de dados fiscais”.

Escola e plano de saúde 

Ainda de acordo com o MP-RJ, o dinheiro desviado do gabinete do então deputado da Alerj seria utilizado para o pagamento de mensalidades escolares das duas filhas do ex-deputado e também para o pagamento do plano de saúde da família, ambos feitos por Queiroz.

"Nos extratos bancários do ex-deputado e sua esposa verificou-se que foram pagos R$ 251.847,28, mas somente debitados R$ 95.227,36, uma diferença de R$ 153.237,65 entre os valores dos títulos debitados nas contas do casal e a soma das despesas escolares, que corresponde a 53 boletos bancários pagos com dinheiro em espécie não proveniente das contas do casal", aponta a investigação.

O mesmo teria acontecido em relação ao plano de saúde da família do ex-deputado. "Os débitos nas contas correntes do casal foi de R$ 108.407,98, quantia equivalente a 63 boletos bancários pagos com dinheiro em espécie de origem alheia aos rendimentos lícitos do casal mas foram debitados das contas do casal apenas R$ 8.965,45 referentes a títulos de pagamentos", revela o Ministério Público.

Vazamento

O MP-RJ intimou o senador a prestar depoimento por causa da investigação criminal que apura vazamentos da Polícia Federal (PF) na Operação Furna da Onça, deflagrada em 2018. A operação que trouxe à tona a denúncia do esquema de rachadinha no gabinete de Flávio Bolsonaro teria sido adiada para não afetar a eleição de seu pai, Jair Bolsonaro. A investigação apura o vazamento da informação para o ex-deputado.

Em maio deste ano, Paulo Marinho (PSDB), suplente do senador Flávio Bolsonaro, afirmou que o parlamentar foi avisado, entre o primeiro e o segundo turno das eleições de 2018, que a operação da Polícia Federal contra Fabrício Queiroz e desvio de dinheiro público na Assembleia fluminense, seria deflagrada em novembro daquele ano.

Segundo declarou Marinho, que é pré-candidato à prefeitura do Rio, o alerta a Flávio partiu de um delegado da PF, partidário de Jair Bolsonaro. Na ocasião, ele afirmou que Flávio Bolsonaro o procurou “absolutamente transtornado”, em busca de indicação de um advogado criminal. E lhe confessou que os policiais teriam impedido a deflagração da operação em outubro de 2018, no meio das eleições, para não prejudicar a candidatura de Bolsonaro à presidência.

O partidário de Bolsonaro na PF ainda teria dito a seu filho que deveria demitir imediatamente Queiroz e sua filha, Nathália Queiroz - essa que estava lotada no gabinete do presidente, à época, deputado federal em Brasília. Ambos foram, de fato, exonerados no dia 15 de outubro de 2018.

Histórico das decisões

Em janeiro do ano passado, após notificação para prestar depoimento ao MP-RJ, os advogados de Flávio Bolsonaro alegaram que o senador possuiria foro por prerrogativa. O ministro Marco Aurélio negou o recurso. Mas em agosto, mesmo depois da decisão de Marco Aurélio, a defesa do senador entrou com habeas corpus alegando que caberia ao Órgão Especial do TJ-RJ julgar o atual senador. O pedido foi novamente negado, desta vez pela desembargadora Mônica Tolledo de Oliveira.

Mas no início de março deste ano, os advogados do senador insistiram e renovaram a alegação de foro privilegiado para o senador ao entrar com um novo habeas corpus, levando à mudança na decisão por parte do Colegiado da 3ª Câmara Criminal do TJ-RJ, que agora está sendo contestada pelo MP-RJ.

Edição: Eduardo Miranda