Milícia

Advogados da família Bolsonaro tinham ligação com miliciano morto em fevereiro

Adriano foi morto na Bahia em fevereiro deste ano durante uma operação policial

Brasil de Fato | Belém (PA) |
Ex-capitão da PM, Adriano da Nóbrega foi executado durante uma operação policial em fevereiro deste ano - Divulgação

O advogado Luis Botto Maia, ligado à família Bolsonaro e responsável hoje pela defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) se comunicou o miliciano Adriano da Nóbrega em dezembro de 2019, quando ele estava foragido.

Adriano foi morto na Bahia em fevereiro deste ano durante uma operação policial. Além disso, há mensagens que apontam indícios de que Queiroz mediava conflitos entre milicianos em Rio das Pedras, no Rio de Janeiro. O advogado que assumiu a defesa de Queiroz, Paulo Emílio Catta Preta, é o mesmo que atuava na defesa do miliciano executado em fevereiro.

Segundo informações do jornal Folha de S. Paulo, que teve acesso à investigação, antes do encontro houve uma reunião com Fabrício Queiroz e o advogado Frederick Wassef, que defende tanto Flávio Bolsonaro quanto o próprio presidente. O MP aponta que Márcia Aguiar, esposa de Queiroz, também participou da reunião. 

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O encontro, segundo a Promotoria, ocorreu no dia 3 de dezembro de 2019. Queiroz e o advogado Frederick Wassef se encontraram com Raimunda Veras Magalhães e Julia Lotufo, mãe e a esposa de Adriano da Nóbrega, respectivamente. O encontro foi na cidade de Astolfo Dutra, em Minas Gerais. 


Ao menos R$ 69,5 mil foram depositados nas contas bancárias de Queiroz por restaurantes administrados pelo miliciano (Adriano da Nóbrega e seus familiares). / Reprodução

Busca e apreensão 

O Ministério Público chegou até essas informações por meio de mensagens encontrada no celular de Márcia (esposa de Queiroz), que também está com um mandado de prisão expedido. O aparelho foi apreendido em dezembro do ano passado em um cumprimento de busca e apreensão.

Nas mensagens, Queiroz orienta a mulher dele (Márcia Aguiar) a se encontrar Botto Maia (advogado dos Bolsonaro), a fim de receber instruções. Em 30 de novembro, Raimunda (Mãe de Adriano da Nóbrega) pede para que Márcia a encontre pessoalmente no dia seguinte na cidade mineira. A cidade fica a 273 km do Rio de Janeiro.

Na mensagem, Márcia diz: “A esposa do amigo vai estar com a mãe dele terça-feira [dia 3/12/19]. Aí ela vai falar com o amigo sobre o recado. Depois que ela falar com o amigo, ela vai entrar em contato comigo”, escreveu Márcia. O amigo, para os investigadores, é o miliciano até então foragido Adriano da Nóbrega.

As mensagens revelam que, um dia antes da reunião, Botto Maia se encontrou com o advogado Frederick Wassef em Atibaia – onde Queiroz esteve ao longo do último ano.

“Anjo já foi?”, perguntou Márcia a Queiroz no dia 2 de dezembro, usando o apelido atribuído a Wassef. “Gustavo já foi embora?”, questionou ela em seguida.


Encontro entre o advogado Luis Gustavo Botto Maia, a esposa de Queiroz e a mãe de Adriano Nóbrega. / Reprodução

De acordo com as mensagens, Márcia (esposa de Queiroz) ficou na casa de Raimunda por três dias até a chegada de Botto Maia. Na noite da reunião, 3 de dezembro, Queiroz recebeu da mulher uma foto dos três. Júlia (esposa de Adriano da Nóbrega) não aparece na imagem.

Quem é Luis Botto Maia?

O advogado Luis Botto Maia, trabalhou na campanha de Flávio Bolsonaro ao Senado em 2018. Ele foi ainda o responsável pela prestação de contas do PSL no Rio de Janeiro. Ano passado, recebeu uma procuração do senador para ser representante legal de Flávio Bolsonaro junto ao MP-RJ no acompanhamento da investigação do caso da “rachadinha”.

Atualmente, ele tem um cargo comissionado na Assembleia Legislativa do Rio como assessor parlamentar do deputado Renato Zaca, ex-PSL e atualmente sem partido. Até o final de março deste ano, ele era chefe de gabinete do deputado estadual Dr. Serginho, líder do PSL na Casa.

Botto Maia é irmão do bombeiro tenente-coronel Lauro Botto, preso, quando era capitão, durante manifestação dos bombeiros em 2011 por melhores salários e condições de trabalho. Na época, Flávio Bolsonaro era deputado estadual pelo PP e defendeu Lauro em plenária na Assembleia e também prestou auxílio para que ele fosse solto.

O teor das mensagens aponta ainda que Raimunda (mãe de Adriano da Nóbrega) e Márcia (esposa de Queiroz) se encontraram no dia 17 de novembro, supostamente com a resposta de Adriano para Queiroz. O MP-RJ chega a afirmar que o miliciano iria organizar um plano de fuga para toda a família do ex-assessor de Flávio. Entretanto, não há no pedido de prisão, a indicação da origem desta informação.

A ligação de Queiroz com Adriano da Nóbrega

Queiroz e Adriano trabalharam juntos no 18º Batalhão da PM. Desse contato, familiares do ex-PM foram contratadas como assessoras no gabinete de Flávio Bolsonaro. A ex-esposa de Adriano da Nóbrega, Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega, trabalhou junto com o filho do presidente de 2007 até novembro de 2018, e Raimunda (mãe de Adriano da Nóbrega), de abril de 2016 a novembro de 2018.

Adriano foi morto em fevereiro deste ano, na Bahia, em uma operação policial, depois de mais de um ano foragido, A polícia investiga as circunstâncias da morte e a família dele afirma que temia que ele pudesse ser alvo de uma “queima de arquivo”.

Repasses bancários

As investigações dizem ainda que Queiroz foi abastecido por repasses de contas bancárias controladas pelo miliciano Adriano da Nóbrega. A estimativa do MP-RJ é que o ex-assessor de Flávio tenha recebido do miliciano mais de R$ 400 mil ao longo dos 11 anos sob investigação (2007 a 2018).

Os promotores revelam ainda indícios de que Queiroz teria influência sobre milicianos que atuam em Rio das Pedras, grupo comandado por Adriano segundo outras investigações.

A suspeita vem de mensagem recebida por Márcia (esposa de Queiroz) em que um homem não identificado que pede a intervenção de Queiroz para solucionar desentendimento com um comerciante do bairro.

O áudio, encaminhado para  Queiroz, indica que o homem foi cobrado por integrantes da milícia por ter sido acusado de agressão pelo comerciante.

“Eles foram lá na Tijuquinha, né, os ‘caras que comanda aqui’ e foi falar que eu bati nele, isso e aquilo. Uma coisa que não aconteceu. Os ‘meninos’ me chamaram. Entendeu? Só que eu conheço eles, né. Conheço os ‘meninos’ tudo. Aí, poxa. Aí eu queria que se desse para ele [Queiroz] ligar, se conhecer alguém daqui, Tijuquinha, Rio das Pedras, os ‘meninos’ que cuida daqui”, disse o homem.

Queiroz responde à mulher pedindo para avisar ao interlocutor que ele não poderá ligar para ninguém.

“Isso aí vai, uma ligação dessa acontece de eu estar grampeado, vai querer me envolver em algum coisa aí porque o pessoal daí vai estar tudo grampeado. Isso aí a gente, eu posso ir quando estiver aí pessoalmente...”, disse Queiroz.

A suposta influência na quadrilha foi um dos fundamentos da prisão de Queiroz. Ele foi preso nesta quinta-feira, 18, sob suspeita de ser o operador financeiro da “rachadinha” no antigo gabinete do senador na Assembleia. Ele é acusado também de atuar na manipulação de provas do esquema, atrapalhando as investigações.

A esposa de Queiroz, Márcia, também foi alvo de mandado de prisão do juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal, mas não foi localizada em seu endereço. Ela já é considerada foragida pelo MP-RJ.

O magistrado determinou a perda da função pública de Botto Maia, bem como o comparecimento regular à Justiça e proibição de contato com testemunhas do caso.

Edição: Leandro Melito