Rio Grande do Sul

VIOLÊNCIA

Entidades repudiam agressões em ato pró-intervenção militar realizado em Porto Alegre

Bolsonaristas realizaram atos em diversas cidades; em Brasília, presidente fez discurso de cima de uma caminhonete

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Trecho de vídeo no momento que um agressor desfere um soco em uma mulher - Reprodução Facebook

Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro agrediram pelo menos quatro pessoas durante um ato que o grupo pedia intervenção militar e fechamento do Congresso Nacional em Porto Alegre, na tarde deste domingo (19). Vídeos publicados nas redes sociais mostram as cenas de violência. Em um deles, captado por um fotógrafo da RBS, se vê homens vestidos de verde e amarelo agredindo a socos e pontapés uma mulher e um homem vestidos de vermelho. No final do vídeo, o fotógrafo também recebeu um soco. Entidades representantes do jornalismo manifestaram repúdio às agressões.

Conforme informações do Correio do Povo, a confusão teria começado após uma mulher com uma máscara 'Fora Bolsonaro' ter ficado nua. Ela estava com uma bandeira do Brasil. A fotógrafa Márcia Velasques Campos, que passeava com seus quatro cachorros, tentou impedir as agressões e também recebeu um soco. Ela registrou Boletim de Ocorrência por agressão na 1ª Delegacia de Polícia (DP) de Porto Alegre. Em seguida, a partir de divulgação da imagem nas redes sociais, a fotógrafa identificou o agressor que aparece no vídeo como sendo Paulo Miguel Rempel, enfermeiro, servidor público do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) afastado por invalidez desde 2007.


Publicação que levou um dos agressores a ser identificado / Reprodução Facebook

"Ao se dar conta que seria identificado, Rempel fechou as caixas de comentários de suas postagens e ainda fez uma publicação dizendo que não pode comparecer ao ato deste domingo, em uma tentativa de se livrar das acusações", informa matéria da Revista Fórum. "Postagens recentes dele, no entanto, mostram que ele estava divulgando a manifestação em questão. Outras publicações dão conta de que o agressor é apoiador de uma intervenção militar, uma das pautas do ato"

O HCPA emitiu uma nota em relação ao caso, repudiando qualquer forma de agressão. Informou “que o homem que protagonizou cenas de violência contra uma mulher está afastado de suas atividades no hospital há mais de uma década. O HCPA reforça seu compromisso com a vida e com o respeito pleno a todas as pessoas, materializado em suas práticas cotidianas e explicitado em seu código de conduta para atuação de seus colaboradores”, diz a nota.

Entidades repudiam violência

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) emitiram notas em que denunciam e repudiam a agressão e o cerceamento ao trabalho de profissionais da imprensa. “Jefferson Botega e Fabio Schaffner, do grupo RBS, faziam a cobertura jornalística de uma manifestação pedindo intervenção militar e fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF). A fotógrafa Márcia Velasques Campos, que estava no local, também foi agredida. Aproximadamente 200 apoiadores do presidente Jair Bolsonaro ocupavam a frente do Comando Militar do Sul, situado no Centro Histórico da capital gaúcha”, explica a nota.

“As duas entidades reprovam toda e qualquer forma de ataque ao livre exercício profissional. A ação ocorrida em Porto Alegre, contra jornalistas que atuavam em pleno período de pandemia e confusão política, representa uma tentativa de intimidação à atividade profissional, que não aceitaremos. Também repudiamos manifestações que pedem a volta do regime militar e o ataque à democracia e nos solidarizamos com as demais vítimas da agressão”, conclui.

A Associação Riograndense de Imprensa (ARI) também condenou a agressão. “O jornalista, assim como demais profissionais da mídia, estava cumprindo sua missão de registro da História neste momento de pandemia e turbulência política. Um pequeno grupo, com propostas que ferem a Constituição Federal, agride a democracia ao intimidar a imprensa no justo momento em que a população brasileira tanto precisa do jornalismo”, diz a nota.

Críticas à participação de Bolsonaro em manifestação


O discurso do presidente Jair Bolsonaro aos apoiadores de intervenção militar é interrompido por tosses / AFP

Manifestações pró-intervenção militar ocorreram em diversas cidades brasileiras, neste domingo, em meio ao crescimento nos casos de coronavírus no país. Em Brasília, tossindo muito, Bolsonaro discursou durante o ato em frente ao Quartel General do Exército. A cena provocou o repúdio de dezenas de organizações e lideranças políticas pelo país. Juristas, políticos, organizações internacionais e ministros apontam crime de responsabilidade em atitude do presidente.

As Centrais Sindicais emitiram uma nota conjunta repudiando a escalada golpista liderada pelo presidente. “Sua participação em um ato em defesa da volta do famigerado AI-5, do fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, e pela ruptura da ordem democrática, prevista na Constituição de 1988, foi mais um episódio grotesco desta escalada”, diz a nota. O texto encerra com um chamamento aos “líderes políticos e da sociedade civil, os representantes dos Poderes Legislativo e Judiciário, das instituições, bem como a todos os democratas, a cerrarem fileiras na defesa da Democracia para barrar os planos do atual presidente de impor um regime autoritário e repressivo”.

Listando crimes de responsabilidade cometidos pelo presidente, a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) afirmou que Bolsonaro “violou normas sanitárias de isolamento social como prevenção à propagação do novo coronavírus, atentou contra o fim do isolamento social, utiliza seus poderes persuasivos e dissuasivos para impedir um projeto unificado de combate à covid-19, incitando o caos em momento de grave crise social, econômica e política do país”.

“É assustador ver manifestações pela volta do regime militar, após 30 anos de democracia. Defender a Constituição e as instituições democráticas faz parte do meu papel e do meu dever. Pior do que o grito dos maus é o silêncio dos bons (Martin Luther King)”, publicou no Twitter o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso.

“A mesma Constituição que permite que um presidente seja eleito democraticamente têm mecanismos para impedir que ele conduza o país ao esfacelamento da democracia e a um genocídio da população”, publicou o ex-presidente Lula.

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que “pregar uma ruptura democrática diante dessas mortes é uma crueldade imperdoável com as famílias das vítimas e um desprezo com doentes e desempregados”.

Governadores de 20 estados, incluindo o gaúcho Eduardo Leite (PSDB), divulgaram uma carta de apoio ao Congresso na tarde deste domingo (19). O documento é uma resposta aos últimos ataques do presidente Jair Bolsonaro ao parlamento. "O Fórum Nacional de Governadores manifesta apoio ao Presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre, e ao Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, diante das declarações do Presidente da República, Jair Bolsonaro, sobre a postura dos dois líderes do parlamento brasileiro, afrontando princípios democráticos que fundamentam nossa nação", diz trecho da carta, que foi divulgada na tarde deste domingo pelo Twitter do governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB).

Até mesmo a organização internacional de direitos humanos Human Rights Watch (HRW) emitiu uma declaração na qual afirma que a atitude de Bolsonaro é "irresponsável, perigosa" e um "flagrante desrespeito às recomendações do seu próprio Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde".

Ato Institucional 5

Cassação de mandatos parlamentares, suspensão de direitos políticos de civis, censura prévia da imprensa, fechamento do Congresso Nacional e das assembleias legislativas.

Há pouco mais de 51 anos, no dia 13 de dezembro de 1968, o Ato Institucional 5 (AI-5) estabeleceu essas e outras medidas de exceção que deram início ao período mais repressivo da ditadura militar brasileira (1964-1985). O AI-5 autorizou o uso de ações repressivas, chamadas de “punições revolucionárias” pelos militares, por prazo indeterminado.

Cinco décadas depois, o ato que institucionalizou o terror e a perseguição política aos opositores do regime, foi defendido pelo filho de Jair Bolsonaro e deputado federal Eduardo Bolsonaro contra o que chamou de radicalização da esquerda, a exemplo dos protestos no Chile.

"Se a esquerda radicalizar, a gente vai precisar ter uma resposta. E uma resposta pode ser via um novo AI-5, pode ser via uma legislação aprovada através de um plebiscito como ocorreu na Itália. Alguma resposta vai ter que ser dada", afirmou o parlamentar, no fim de outubro.

 

*Com informações do Correio do Povo e Revista Fórum

Edição: Katia Marko