bomba-relógio

RJ não adere medidas do Conselho Nacional de Justiça de combate à covid-19 em prisões

Resolução publicada há um mês orienta ações para reduzir superlotação em presídios e evitar aumento de contaminações

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Levantamento realizado ano passado pela CNJ aponta que Brasil tem 812.564 presos, desses 41,5% ainda não foram julgados; na foto, presídio em Alta Floresta (MT) - Foto: Christiano Antonucci

Celas superlotadas, deficiência na prestação de serviços internos e na alimentação, número insuficiente de agentes penitenciários. Esses elementos fazem parte da realidade de muitas penitenciárias país afora. Dono da terceira maior população carcerária do mundo, o Brasil tem hoje mais de 840 mil presos, um terço dos quais, provisórios.

Em tempos de coronavírus e da necessidade de manter isolamento social, um sistema carcerário com tais características é uma verdadeira bomba-relógio. Por essa razão, o CNJ, Conselho Nacional de Justiça, expediu a resolução 62. Professora de Direito Penal da UFRJ, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Luciana Boiteux explica o que prevê esta resolução.

"Basicamente, prestação e disponibilidade de equipamentos de proteção individual (EPIs) aos agentes penitenciários, conseguir ter uma política interna de álcool gel para prevenção. Mas também, umas das medidas é o desencarceramento, ou seja, reduzir o número de presos para conseguir fazer a prevenção e consegui reduzir os riscos de agravamento dessa pandemia."

Luciana pontua o que tem sido feito pelo governo do estado do Rio de Janeiro para se adequar ao que estabelece a resolução 62.

"O que o governo do estado fez até agora, foi proibir visita, a entrada de alimentos pela família, com alguma flexibilização para ao menos a família poder entregar artigos de higiene e, em alguns casos, alimentos para as pessoas que estão presas. E segundo informações que eu tive, está sendo providenciado a testagem para presos que apresentem já algum sintoma."

Luciana também pontua os esforços da Defensoria Pública e como o Ministério da Justiça está lidando com as determinações da resolução.

"Por parte da Defensoria Pública, especialmente, houve um habeas corpus para liberar idosos que não foi concedia. Para vocês terem uma ideia: o que Moro [Ministro da Justiça e Segurança Pública] está propondo é separar as pessoas nas celas com 'cortininhas', mas não tem espaço físico em nenhuma prisão do Rio de Janeiro, e muito menos no Brasil. E vai ser muito mais caro manter os presos com as recomendações de saúde do que realizar o desencarceramento do público de risco."

A mãe de um detento do Complexo de Gericinó, no Rio, que não quis se identificar, descreveu a situação da penitenciária.

"É um lugar totalmente insalubre, propício a todo tipo de doença. Lá há um índice alarmante de tuberculose, sarna... Os produtos de higiene somos nós familiares que levamos."

Ela lamenta o descumprimento, até aqui, do desencarceramento previsto na resolução 62.

"Muito triste também de não terem acatado a 62, que autorizava a saída de presos que não tivessem cometido crimes com violência, porque isso ajudaria muito, haveria um esvaziamento substancial nas celas, que são abarrotadas de pessoas e insalubre."

Procurados, a Secretaria Estadual de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro e o Ministério da Justiça não se manifestaram até o fechamento desta reportagem.

A resolução 62 do CNJ estabelece, entre outras coisas, a reavaliação de prisões de mulheres lactantes, gestantes e mães de crianças de até 12 anos; pessoas presas em estabelecimentos penais que estejam com ocupação superior à capacidade, que não disponham de equipe de saúde lotada no estabelecimento, que estejam sob ordem de interdição, com medidas cautelares determinadas por órgão do sistema de jurisdição internacional ou que disponham de instalações que favoreçam a propagação do novo coronavírus; prisões preventivas que tenham excedido o prazo de 90 dias ou que estejam relacionadas a crimes praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa.