Paraná

EDUCAÇÃO

Governo não se preocupa com realidade dos alunos ao propor EaD, diz APP-Sindicato

Sindicato dos professores defende a imediata suspensão do calendário escolar no Paraná, e critica governo do estado

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Para sindicato, ensino a distância gera mais desigualdade - Giorgia Prates

O Conselho Estadual de Educação do Paraná (CEE-PR) aprovou na última terça-feira, dia 31, a deliberação n. 01/2020, autorizando as escolas estaduais, municipais e particulares, a ofertar a modalidade de ensino a distância (EaD). A determinação é válida durante o período da pandemia do novo coronavírus. A APP-Sindicato, entidade que representa os professores da rede estadual, votou contra a proposta. Para Tais Mendes, secretária de assuntos educacionais da APP-Sindicato, “as famílias em sua grande maioria não têm condições e estrutura para acompanhar os filhos'', e o estado, ''não tem como garantir o acesso e a qualidade pedagógica para todos da mesma maneira''.

Taís é representante do sindicato no Conselho Estadual de Educação, e declarou em seu voto que “apesar da legislação educacional permitir a modalidade Educação à Distância – EAD, as escolas não estão preparadas para esta ferramenta de ensino''. A dirigente ainda afirmou que os estudantes extremamente carentes ''não terão acesso aos conteúdos que as atividades não presenciais exigem.”

Ainda de acordo com a representante sindical, um dos dispositivos de deliberação do Conselho, prevê que as direções das escolas precisam avaliar se há condições de implementar esse regime especial de ensino a distância nas turmas. “Neste sentido, nós orientamos que a comunidade escolar também se manifeste e recuse essa proposta”, disse.

DIFICULDADES

Um em cada três estudantes (33,5%) que tentaram vaga no curso superior nos últimos cinco anos por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), não tem acesso à internet e a dispositivos como computador ou celular, que permitam por exemplo, aprender por meio de educação a distância (EaD). Os dados foram levantados pela plataforma interativa Quero Bolsa, criada para estudantes buscarem auxílio e descontos para inscrição em faculdades particulares. Os números apontam para os prejuízos que a implantação dessa modalidade, em tempos da pandemia da Covid-19, oferece para o ensino público.

Andréa Cordeiro, professora no Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR), diz ser entusiasta do uso das ferramentas tecnológicas na educação. Porém, como mãe de uma criança de 10 anos que estuda em escola particular, tem observado que existem muitas dificuldades para isso acontecer com qualidade. “Nós temos em casa toda estrutura necessária, mesmo assim tenho sentido dificuldades. Imagina isso na rede estadual de ensino que é diversa em sua realidade. Como a gente consegue fazer isso diante de tantas desigualdades de possibilidades de acesso e verdadeiro aprendizado?”, questiona. 

Para ela, os professores priorizam o aprendizado no lugar de cumprir o calendário, e para isso, precisam estar preparados. “Os professores não estão preparados para isso. Essa transposição imediatista que faz com que o professor tenha que se transformar em youtuber, produtor de conteúdo e sem nenhuma condição técnica”, afirma. Ela ainda afirma que será necessário aprender com o momento, ter calma e propor algo mais refletido, e olhar estes alunos com mais ‘’amorosidade’’. 

TADEU VENERI: “PROPOSTA É UM DESASTRE’’

Durante sessão legislativa virtual da Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP) desta segunda-feira, 06, o líder da oposição deputado estadual Tadeu Veneri (PT), qualificou a proposta de aulas à distância, neste momento de pandemia do coronavírus, como absurda. “É um desastre. É a proposta mais absurda que ouvi nestes vinte anos. No interior, por exemplo, muitas pessoas não tem internet. A intenção pode ser boa. Mas, entre a intenção e ação há um espaço imenso,” disse. O deputado chegou a implorar que o Ministério Público intervenha. “Eu peço que os vereadores façam este pedido para o MP, em suas cidades. Não há como fazer o acompanhamento dos alunos com qualidade, está gerando pânico nas famílias que perdem o conteúdo e começam a ligar para os professores.” 

CNTE: EAD É IMPROVISO

A Confederação dos Trabalhadores em Educação (CNTE) também já se posicionou sobre o assunto. Em nota pública, a entidade destacou que “as escolas não podem ser vítimas de mais improvisações que prejudiquem a qualidade da educação”.

Em outro trecho, a nota enfatiza os riscos que a modalidade oferece. “De nada adianta autorizar algo que não poderá ser efetivamente praticado por todos/as! Igualmente, não se deve utilizar o momento de restrição escolar para fomentar a mercantilização desenfreada de plataformas de EaD, através da iniciativa privada, ou mesmo para flexibilizar o currículo presencial, como tenta induzir a reforma do ensino médio (art. 36 da LDB)”.

Confira a seguir os motivos elencado pela APP Sindicato para não usar a EAD durante a pandemia do coronavírus: 

1) NÃO ATENDE A REALIDADE DO BRASIL

A maioria da população brasileira não tem acesso à internet em suas casas e nas escolas não há estrutura adequada sequer para as aulas presenciais.

2) NÃO SE MUDA A AULA DA SALA PARA A TELA

Não se faz EaD simplesmente mudando as aulas presenciais para o ambiente virtual.

3) NÃO GARANTE A APRENDIZAGEM

EaD é uma forma para quem já faz ou fez algum curso desta forma. Por isso a falta de aulas presenciais vai prejudicar a qualidade da educação.

4) NÃO ATENDE A MAIORIA DA POPULAÇÃO

Apenas 42% das casas têm computador e quanto menor a renda, mais difícil o acesso. Ou seja, a maior parte dos(as) estudantes não terão acesso às aulas.

5) AUMENTA AS DESIGUALDADES

Se apenas parte dos(as) estudantes terão acesso, isso vai gerar ainda mais desigualdade no acesso à educação. Os(as) mais pobres, novamente, serão os(as) mais prejudicados(as).

6) OS(AS) PROFESSORES NÃO RECEBERAM FORMAÇÃO PARA ATUAR NA EaD

A maioria dos(as) nossos(as) professores(as) não foram preparados(as) para atuar na educação a distância. Portanto, não estão aptos(as), assim como os(as) estudantes, para essa proposta.

7) A ESTRUTURA DAS ESCOLAS É PRECÁRIA

Muitas escolas não possuem sequer acesso à Internet.

8) NÃO É ADEQUADO PARA O DESENVOLVIMENTO HUMANO

As crianças precisam desenvolver autonomia, capacidade de concentração e autodisciplina e isso só é possível na escola.

9) NÃO RESPEITA A COMUNIDADE ESCOLAR

A imensa maioria dos(as) estudantes não têm recursos necessários para realizar as atividades a distância. Implantar EaD é desrespeitar professores(as), funcionários(as), pais, mães, responsáveis e, principalmente, os(as) nossos(as) estudantes.

10) É UM RISCO PARA A PRIVACIDADE DAS PESSOAS

A gratuidade de aulas online, por exemplo, costuma esconder modelos de negócio em que o lucro das empresas vem da exploração dos dados de seus(suas) usuários(as) para, com isso, ofertar produtos e serviços.

Edição: Gabriel Carriconde