Rio de Janeiro

RETROCESSOS

Anistia Internacional condena política contra direitos humanos no governo Bolsonaro

ONG destaca crise ambiental, violência policial e impunidade no caso da vereadora Marielle Franco

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Primeiro ano de mandato do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi marcado por retrocessos nos direitos humanos - Marcos Corrêa/Agência Brasil

Durante o primeiro ano de mandato do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o discurso abertamente contrário aos direitos humanos foi colocado em prática por autoridades e traduzido em medidas administrativas e legislativas. É o que aponta o relatório “Direitos Humanos nas Américas: retrospectiva 2019”, da ONG Anistia Internacional, lançado na última semana. 

No documento, a organização destaca a crise ambiental na Amazônia, o agravamento da violência policial, sobretudo no Rio de Janeiro, a flexibilização do acesso a armas de fogo e o brutal assassinato da defensora de direitos humanos Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, como um exemplo de impunidade. 

“Os ataques aos direitos humanos no Brasil foram tão brutais, que parecíamos estar vivendo antes da Constituição Federal de 1988, que nos garante direitos fundamentais. A retórica de linha dura que autoridades federais e estaduais adotam abriu espaço para violências cometidas, também por agentes do Estado, especialmente contra defensores e defensoras dos direitos humanos, negros e negras, moradores de favelas, indígenas, pessoas LGBT e mulheres”, afirma Jurema Werneck, secretária executiva da Anistia Internacional Brasil. 

O governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel (PSC) é citado nominalmente no relatório para condenar ações relacionadas à chamada “guerra às drogas” que vitimam moradores de favelas e comunidades carentes da periferia e da Região Metropolitana do estado. Para a Anistia, autoridades federais e estaduais fazem declarações que alimentam a violência das forças policiais e de segurança.  

“Essa política do enfrentamento gerou uma cifra assustadora para o Estado. Dados de um estudo do Ministério Público Estadual (MPRJ) apontaram a Polícia Militar do Rio de Janeiro como a que mais mata no Brasil. De janeiro a julho, segundo as estatísticas oficiais, 1.249 pessoas foram mortas pela polícia. Segundo o MPE, esse número representou um aumento de 16% em relação ao mesmo período de 2018 (1.075)”, expõe o documento.

Impunidade

Às vésperas de completar dois anos no dia 14 de março, a dificuldade de solucionar o assassinato da vereadora Marielle Franco e descobrir os mandantes do crime também foi lembrada no relatório. “O assassinato de Marielle Franco só estará completamente resolvido quando todos os envolvidos, incluindo os autores intelectuais, tiverem sido levados à Justiça, num julgamento imparcial e transparente, que respeite as regras do direito internacional.”

Para Jurema Werneck, a resolução do caso é fundamental para transmitir a mensagem de que “nenhuma violência contra os defensores e as defensoras de direitos humanos é tolerada no país”.

Amazônia 

Na área ambiental, o relatório utilizou dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), instituição pública brasileira que monitora por satélite a situação da Amazônia, para ressaltar o aumento do desmatamento

“A área estimada de desmatamento no período de agosto de 2018 a julho de 2019 nos nove estados que compõem a Amazônia Legal brasileira foi de 9.762 km². Esse número representa um aumento de 29,54% com relação à área desmatada calculada no ano anterior, que foi de 7.536 km². O INPE confirmou também um aumento de 30% nas queimadas de florestas em 2019, com 89.178 focos de incêndio detectados por satélite”.

O Instituto foi alvo de críticas do governo e o então diretor do Inpe, Ricardo Galvão, exonerado. “O governo do Presidente Jair Bolsonaro não tomou medidas efetivas para lidar com a crise ambiental na Amazônia, que ganhou destaque internacional devido às queimadas em larga escala”, diz o texto.

Povos indígenas

Para a Anistia Internacional, Bolsonaro não só descumpriu a obrigação de proteger os povos originários do Brasil, como “muitas das medidas que tomou aumentaram os riscos que eles enfrentam.”

“E esses riscos ficaram evidentes no aumento de invasões em terras indígenas, que passaram de 96 em 2017 para 109 em 2018, e aumentaram de forma dramática em 2019, com 160 casos registrados somente nos primeiros nove meses do ano, segundo o Conselho Indigenista Missionário (CIMI).”

A ONG chama atenção para o número crescente de homicídios de ativistas ambientais, inclusive lideranças indígenas, associados à extração de recursos naturais. Uma das vítimas foi o líder Guajajara Paulo Paulino Guajajara, de 26 anos, assassinado em novembro na Terra Indígena Arariboia, no Maranhão. Ele foi o quarto membro do grupo Guardiões da Floresta a ser assassinado.

Edição: Vivian Virissimo