Rio de Janeiro

EDUCAÇÃO

Na Unirio, Bolsonaro nomeia reitor que não foi escolhido pela comunidade acadêmica

Decreto de intervenção em universidades também atinge instituições de Minas e do Mato Grosso do Sul

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Em abril, durante a votação, ouviram-se gritos de “é golpe” e “respeitem a decisão da comunidade"
Em abril, durante a votação, ouviram-se gritos de “é golpe” e “respeitem a decisão da comunidade" - Bruno Marinoni

Sem submeter sua candidatura à comunidade acadêmica, o professor Ricardo Cardoso foi nomeado na última terça-feira (18) o novo reitor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio). O ato do presidente Jair Bolsonaro e do ministro da Educação, Abraham Weintraub, foi publicado no Diário Oficial da União (DOU).

A medida surpreendeu professores e alunos da Unirio. Em consulta eleitoral realizada entre os dias 3 e 6 de abril, o professor Leonardo Castro foi o indicado, com 2.753 votos (72% dos votos válidos), para ocupar o cargo de reitor e a professora Maria do Carmo para a vice-reitoria. O novo reitor da instituição sequer teve sua chapa inscrita no processo democrático.

Dias depois, o colégio eleitoral não sancionou o resultado da consulta eleitoral e nomeou em primeiro lugar da lista tríplice o professor Cardoso, que é o atual vice-reitor da Unirio. As únicas chapas inscritas no processo de consulta, a Chapa 1, de Leonardo Castro, e a Chapa 2, da professora Cláudia Aiub, ficaram de fora.

Em conversa com o Brasil de Fato, Leonardo Castro disse que a medida é subserviente ao governo de Bolsonaro e fere a autonomia da Unirio. Segundo o professor, que foi eleito democraticamente na universidade, o reitor nomeado pelo governo poderá ter problemas de legitimidade junto à comunidade acadêmica.

"Isso é trazer para dentro da universidade o discurso de intervenção, o discurso do governo Bolsonaro. É uma atitude subserviente, que a gente vem falando desde a campanha que ela faz mal à universidade, e que tira dela a autonomia de formulação de ações que ela deveria privar", afirma Castro, professor da Escola de Educação.

Um dos diretores da Associação dos Docentes da Unirio (Adunirio), o professor Rodrigo Castelo chamou a atenção para a situação de exceção na história do Brasil.  

“Pela primeira vez na história das universidades brasileiras, pós ditadura empresarial-militar, um professor ou uma professora não passou pela consulta eleitoral e foi nomeado primeiro lugar da lista da tríplice. E com essa lista tríplice o governo Bolsonaro, na sua tradição golpista, nomeou o professor Ricardo, sendo que ao longo do tempo, a nossa reitoria procurou apoio no governo federal”.

Debates

Castelo, da Adunirio, contou também que o novo reitor não esteve em nenhum dos cinco debates públicos na consulta eleitoral, realizados em diferentes espaços da universidade. “As duas candidaturas se colocaram para o debate, foram debates muito qualificados, centenas de pessoas participando. Por isso, essa nomeação nos deixou muito consternados aqui na Unirio”.

Acusado de não buscar nenhum tipo de diálogo com a comunidade acadêmica durante todo o tempo do processo eleitoral, o novo reitor da Unirio, Ricardo Cardoso, afirmou, em nota publicada no site da instituição, que tem “absoluta convicção da responsabilidade e, principalmente, da estabilidade institucional, sem acirramentos, para juntos conquistarmos uma Unirio ainda melhor”.

Na próxima terça-feira (25), às 16h, os movimentos sindical e estudantil farão uma assembleia comunitária para decidir quais serão as próximas ações de luta e resistência a intervenção de Bolsonaro na universidade.

Mais intervenções

No mesmo decreto do Diário Oficial, Bolsonaro conduziu ao cargo de reitor da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM) o professor Luiz Fernando Resende, derrotado em todas as formas de eleição realizadas (direta e via conselho).

A situação se repetiu na Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), no Mato Grosso do Sul, onde Bolsonaro nomeou a professora Mirlene Damázio. Ela não fazia parte da lista tríplice enviada ao MEC e nunca concorreu a processos eletivos na universidade, mas colaborou na campanha da chapa conservadora “UFGD em Ação”, derrotada no processo eleitoral.

Edição: Mariana Pitasse